E é tão mais tarde do que aquilo ao que estamos habituados.
Quase seis da madrugada ou por aí tao perto. Enquanto ainda nos uníamos por
motivos inválidos, ou que nunca existirão. Sobre as horas disseste, que nada
restava. E era suposto perdoar-te o quê? A atenção que não me dás? O valor que
não tens? A posição que não ocupas? Já nada por ti perco. Já pouco ou nada sei.
Por ti nem por mim me movo, aquando me dizem para avançar. Não valeria a pena,
se calhar porque também tu nunca questionaste meras pretensões.
A tua vida: ilusões, monotonia e infelicidade. Já nem
recordo o tom da tua voz assim como esqueci as promessas que tão gastas ficaram
no caminho que nos persegue.
Não sei se ambiciono o que descansa pela nossa pendência. Já
não sei se é em ti que o sentimento e a dor se fundem. Não idealizo, porém,
estátuas quebradas em nosso nome pois não sei sequer, se, também nós somos
imóveis aquando o passar do tempo. Por isso, não guardo carência ou rancor por
uma marca na realidade dos demais, marca essa que, imaginemos, fosse traduzida
num presente constante. Prefiro que, sejamos tal como o vento. Passageiro e
efémero, que por todo o lado oscila, brando ou tempestuoso, mas sempre em
movimento. Ainda que, por vezes nem sequer exista. Ou que não se dê por ele,
assim como por nós não dão conta. Por tantos minutos em que nos perdemos, por
tantos sonhos que não vivemos, em tantas lamentações que por ausência vão
ficando. Suspensos. Não temos nada. Sei que o adeus já menos se aproximou, e
que hoje toca aquele chão que vou pisando, enquanto respiro a certeza de um
final ao qual sempre resisti. Tenho saudades tuas. Mas a vida nunca nos
prometeu felicidade. Não nos enganou, é certo, sim? Se calhar viste sinais onde
o nada persiste e não existe, palavras silenciadas ou quem sabe, textos
inacabados, cuja autoria não fora a minha.
Já nem ouço o bater dos nossos corações. Aquele teu ritmo
falhado que não acompanha o meu. É de dia que se vive, e os dias não mais nos
esperam. Sabes o quanto custa aceitar a perda? Como que uma despedida
intemporal, sem datas que a marquem. Algo certo mas indeterminado. Não somos
fortes, falhámos a oportunidade, falhámos pelo destino. E tão só, hoje junto as
peças: nem me saudas quando regressas, nem um adeus quando partes. Prefiro
achar que tudo está bem quando sei que nego a possibilidade de algo mau estar a
acontecer. Não está e quem sabe jamais, antes estivesse. Antes a arrogância, o
ciúme e a raiva. Do que um virar costas, um desprezo. Só e apenas tal vazio.
Aliados ao silêncio e ao pranto incapaz. Já não te ouço, eu não te consigo
ouvir, qual ausência. Onde é que estás? Onde ficaste tu enquanto te chamo e
lamento? Quase te amo. E embora seja certo que não te vá gratificar de futuro,
reconhece que a eternidade não nos pertence, mas integra-nos. E o concilio das
almas reuniu-nos um dia, a hora estava marcada. Desde aí, que não vais ser tu a
acabar connosco visto que algo, ou alguém, já nos deu o mundo.